sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O Rio Paraíba nos Versos do Poeta Emílio de Menezes

O Rio Paraíba e o vale por ele formado em centenas de anos sempre foram um velho conhecido dos andejos sem lar, dos migrantes coloniais em busca de novas oportunidades, dos viajantes estrangeiros, dos homens de negócios, do tropeiro em mulas a tocar, dos fazendeiros em busca da Corte Imperial, dos Imperadores, dos nobilitados aristocratas de Dom Pedro II, dos políticos da República Velha, dos literatos e do cidadão comum repleto de afazeres no cotidiano das suas vidas.
E o Rio Paraíba na história sempre foi o guia para desbravar e implantar núcleos populacionais no seu correr. Teve papel foi fundamental na ocupação territorial do seu Vale e dele expandiu-se para as regiões da Serra da Mantiqueira (Minas Gerais), Serra do Mar (Parati e Rio de Janeiro), barrancas do Rio Piraí e Fazenda Santa Cruz (Caminho Novo) e em direção para aos portos de embarque do café na região entre Mangaratiba e Angra dos Reis.
Todos que passaram pelo Vale do Paraíba deixaram registros oficiais, memórias e outros escritos a seu respeito, constituindo-se em verdadeiro manancial complexo de vidas entrecruzadas que teceram uma rede social típica que a historiografia ainda não pôde abarcar por completo. Principalmente em literaturas marginais e pouco conhecidas do público, enfeixadas em obras raríssimas de apenas poucas edições, ou perdidas nos veículos da imprensa no final do século XIX e começo do XX.
Com o advento da ferrovia, na segunda metade do século XIX, ligando São Paulo ao Rio de Janeiro, e também com o aparecimento e incremento da referida imprensa no mesmo período, a região passou a receber frequentes visitas de cariocas e paulistas, notadamente de políticos em busca do voto ou de literatos realizando palestras nas cidades cortadas pelo Paraíba ou em São Paulo. Brito Broca rememora um desses, o escritor Coelho Neto, que visitou em Guaratinguetá em 1921 para uma palestra que realizou no antigo Club Literário. E os jornais do Rio anunciam a visita de Quintino Bocayuva e Rui Barbosa na mesma Guaratinguetá.
E aqui destacamos, dentre os inúmeros e assíduos passageiros da estrada de ferro que registraram o Vale do Paraíba em versos, em direção a São Paulo, a figura do poeta Emílio de Menezes, cuja fama foi imensa em sua época, como um dos últimos boêmios do Rio de Janeiro no alvorecer do século XX, ao lado de Olavo Bilac, Paula Ney, Martins Fontes e muitos outros escritores de maior renome na literatura brasileira.
Nasceu em Curitiba-PR em 04/07/1866 e faleceu no Rio de Janeiro em 06/06/1818. Foi membro da Academia Brasileira de Letras, jornalista e poeta com veia satírica da corrente parnasiana (1). E, em 1914, passando pela região do Vale do Paraíba, escreveu um poema sobre o Rio Paraíba, publicado no periódico paulistano “A Cigarra” e depois transcrito na biografia do poeta, de autoria de Raimundo de Menezes (1).  E que também transcrevemos com o objetivo de resgatar e despertar para o leitor as obras do poeta e da literatura no período dele como um todo. Notadamente como fonte essencial para conhecer o pensamento dos homens letrados num período de marcadas mudanças na vida do povo brasileiro (a transcrição vai como está na ortografia original).

AO “PARAÍBA”
Quando te vejo o deslizar das águas
Claras, serenas como os bons momentos
De amor que correm plácidos e lentos,
Vão rolando contigo as minhas mágoas.
Mas, quando as vejo em torvelins violentos,
Tôrvas e turvas a raivar nas fráguas,
Extingo as chamas da alegria, apago-as:
Rolam contigo os meus contentamentos.
E que sobre mim mesmo não exerço
Fôrça contrária à tua, a mim ligada
Qual se liga a áurea rima a um verso terso.
E essa fôrça, que é tudo, vem de um nada:
Às tuas margens balouçou-me o berço
Da criatura eternamente amada!....

 Notas

(1) PAES, José Paulo & MOISÉS, Massaud (organizadores). Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira. São Paulo: Editora Cultrix, 1967.
(2) MENEZES, Raimundo de Menezes. Emílio de Menezes – o último boêmio. 2 ed. refundida. São Paulo: Edição Saraiva, 1949. (Coleção Saraiva, 13). p. 178.

Imagem: O poeta Emílio de Menezes. In:
JORGE, Fernando. Vida e Poesia de Olavo Bilac. 5 ed. São Paulo: Novo Século Editora, 2007. p. 181.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

A Atenas do Vale do Paraíba na Mídia Nacional

Luiz Arrezi
Locutor da Rádio Clube Guaratinguetá
Revista Fon-Fon - 1943
Acervo Biblioteca Nacional
A cidade de Guaratinguetá já teve o seu auge cultural na primeira metade do século XX, reconhecida como a “Atenas do Vale do Paraíba” por possuir importante núcleo de formação educacional, escritores e artistas de renome estadual e nacional. Tudo atestado por memorialistas e pelos grandes veículos de comunicação no Brasil. Foi o período de efervescência dos estudos clássicos e humanistas, quando obscuros jornalistas, professores e outros profissionais das ciências humanas alcançaram méritos no mundo das letras nacionais, como por exemplos: Brito Broca (crítico literário reconhecido), Francisco de Assis Barbosa (membro da Academia Brasileira de Letras) e professores formados na antiga Escola Normal de Guaratinguetá. Assim como pintores, cantores e locutores de rádios: Ernesto Quissak (pintor e escritor), Gastão Formenti (cantor) Luiz Arrezi (cantor de música brasileira, contratado da Rádio Clube de Guaratinguetá); e os locutores da mesma rádio – Walter Horta (locutor-chefe e ator do “Teatro no Ar” - 1942) e Maria Eugenia (locutora, rádio-atriz e diretora do Programa “Da Mulher para a Mulher” – 1942).
Um município que fornecia ensino de qualidade para a região e oferecia o mundo para os jovens. Diferente da atualidade, onde viceja o mais completo descaso com a educação, com a cultura e com o patrimônio histórico. 
Parte de uma memória que é preciso destacar o objetivo de traçar metas culturais para o futuro da cidade de Guaratinguetá, contando com as mais importantes premissas modernas nessas áreas, visando atingir a comunidade de forma ampla.
As imagens abaixo legitimam o texto acima. Foram publicadas pela famosa revista “Fon-Fon”, produzida no Rio de Janeiro na primeira metade do século XX e em parte da seguinte.  
 
 
Gastão Formenti - 1940
Revista Fon-Fon
Acervo: Biblioteca Nacional
Instalação do Núcleo Guaratinguetá da Associação Brasileira de Escritores
Presidência: Professor Ernesto Quissak
Revista Fon-Fon - 1948 - Acervo: Biblioteca Nacional
 
Walter Horta e Maria Eugênia - Rádio Clube
Revista Fon-Fon - 1942
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Rodrigues Alves em Caricaturas - Um Viúvinho no Catete – 1902

Na virada do XIX para o XX, uma preocupação gerava boatos na imprensa: a condição do maior representante da República não ter a sua primeira-dama. E dentre as várias pilhérias humorísticas resultantes do tema em torno de Rodrigues Alves estava a sua viuvez. Desde o inicio da década de 1890 o Conselheiro do Império foi considerado um sem par. Notadamente nos dias que antecederam ao Grande Baile da Posse, em 1902.
Como é de conhecimento geral, o Conselheiro Rodrigues Alves perdeu sua esposa relativamente cedo, quando contava com apenas 43 anos de idade, com alguns filhos em menoridade. E jamais casou novamente, preferindo manter-se fiel a esposa e aos filhos. Quem sabe uma homenagem eterna para aquela que parece ter sido o seu esteio doméstico e público.
 
 
Rodrigues Alves casou em 11 de setembro de 1875 com Ana Guilhermina de Oliveira Borges, filha dos primos, Doutor José Martiniano de Oliveira Borges e de Dona Guilhermina Cândida de Oliveira Borges. Neta paterna do Visconde de Guaratinguetá e sua primeira esposa, Ana Umbelina.
No âmbito doméstico, Ana Guilhermina deu-lhe vários filhos e exerceu praticamente um papel quase que exclusivamente a sombra do marido, enquanto ascendia social e politicamente nas esferas local e regional. Exercendo cargos políticos como vereador, deputado provincial, deputado geral e presidente da Província de São Paulo. Principalmente durante os mandatos em São e no Rio de Janeiro. A esposa ficou em Guaratinguetá cuidando do lar e dos filhos. Excetuando, talvez, por não haver notícias a respeito, quando exerceu a presidência da Província. Como era usual, um costume social de época, deve ter sido a responsável pelo serviço interno do palácio do governo.
E no âmbito político, o casamento trouxe ao titular a herança eleitoral do Visconde de Guaratinguetá, que enorme ascendência exerceu em toda a região do Vale do Paraíba, notadamente nos municípios de Lorena, Areias, São José do Barreiro, Silveiras e Bananal. Isto por ser chefe político que comandava toda a Guarda Nacional, uma instituição criada em 1831 e que serviu de privilegiado trampolim político, social e econômico para os grandes cafeicultores em todo o decorrer do 2º Reinado.
Graças a uma ampla rede de sociabilidade e solidariedade, Rodrigues Alves pode eleger-se para vários cargos e legislaturas por intermédio de um bem formado eleitorado. Assim como um patrimônio financeiro considerável, notadamente entre 1875 e 1877, quando montou, juntamente com a sogra, a empresa Viúva Borges e Genros, cujo fim era o plantio e a comercialização do café das diversas fazendas da família.
Ana Guilhermina faleceu em 28 de dezembro de 1891, quando o marido ocupava pela primeira o Ministério da Fazenda. Não estando presente em Guaratinguetá no período. E daí por diante cuidou da criação e educação dos filhos. Sendo a menor com poucos meses de vida e o maior na idade de quatorze anos (1). Durante a presidência (1902-1906) quem cuidou das fainas domésticas do Catete foi a sua filha mais velha, alcunhada Catita, a qual devotou intenso amor e cuidados para com o pai (2).
E quando eleito para o maior cargo, a situação de viuvez foi evidenciada em alguns órgãos da imprensa carioca, que o chamava de viuvinho ou de presidente sem par, como mostra a imagem acima nos dias que antecederam ao baile da posse. Da autoria do caricaturista C. do Amaral (3).
Notas
(1) Seus filhos sempre estiveram ao seu lado. Os homens da família foram no geral políticos e exerceram cargos públicos relevantes durante a vida. FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Rodrigues Alves: Apogeu e Declínio do Presidencialismo. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora/São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1973.
(2) No Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, que guarda uma parte das correspondências pessoais de Rodrigues Alves, encontram-se inúmeras cartas do pai para a filha e vice-versa. E que foram gentilmente resgatadas por Afonso Arinos de Melo Franco (casado com uma neta do Conselheiro Presidente) após o falecimento de Catita. Que recomendou que com ela fossem sepultadas (Depoimento de Afonso Arinos na sua obra sobre o Rodrigues Alves).
(3) Crispim do Amaral – Pernambucano nascido em 1875 e falecido em 1922, que chegou ao Rio de Janeiro no mesmo ano da posse de Rodrigues Alves na presidência da República. Colaborou na “Revista da Semana” e no “Jornal do Brasil”.
Imagem: Revista “O Malho”. Acervo Digital da Biblioteca Nacional.

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Rodrigues Alves em Caricaturas - Por ocasião da Escolha dos Ministros - 1902

Francisco de Paula Rodrigues Alves foi escolhido pelo Partido Republicano Paulista (PRP) para concorrer ao cargo máximo da República, em substituição a Campos Salles, que realizara um governo de austeridade com intuito de equilibrar as finanças públicas combalidas durante o governo dos três primeiros presidentes. O que deixou o país em condições satisfatórias, possibilitando ao governo seguinte a realização de obras de grande envergadura.
A eleição realizou-se em 1º de março de 1902, obtendo o Conselheiro Rodrigues Alves a totalidade de 592.039 votos, contra 288.285 do seu adversário, o mineiro Afonso Pena.  Resultado esse que, embora mostrasse a força política paulista, não refletia o acirramento nos bastidores por um nome de consenso nacional. Os tramites das trocas e favorecimentos aconteciam sem que muitas das vezes a opinião pública pudesse ter informações corretas. O que também ocorria durante o processo de escolha dos novos ministros por parte do presidente eleito.
E neste último caso, entre a efetiva eleição e a posse na presidência, Rodrigues Alves recolheu-se, na maior parte do tempo, na sua residência de Guaratinguetá, com o objetivo de escolher os nomes de acordo com o seu pensamento. Competentes políticos nos quais pudesse depositar total confiança para executar o seu ambicioso plano de governo: o saneamento e a modernização da cidade do Rio de Janeiro.
Segundo Afonso Arinos de Melo Franco (1), a escolha de um ministério que afirmasse o pensamento do estadista fora trabalho delicado, principalmente pelos acontecimentos políticos decorridos no final do mandato presidencial de Campos Salles, principalmente a escolha de um novo vice-presidente (o eleito fora Silviano Brandão, falecido antes de tomar posse).
Rodrigues Alves fechara-se em sua cidade natal, consultando um ou outro elemento da sua confiança, enquanto os boatos fervilhavam por todo o país e que a imprensa da época ajudou a propalar, demonstrando por informes e imagens como se dava tal espírito de disputa por um cargo ministerial. Vários nomes foram cogitados, prevalecendo, porém, a vontade do presidente eleito, que primeiro convidou o Barão do Rio Branco para ocupar a pasta das Relações Exteriores.
A imagem acima atesta o cerco que se tentou fazer em torno de Rodrigues Alves no período, utilizando-se da situação de viuvez do Conselheiro, um dos motes explorados pela imprensa da época com o objetivo de representar os perigos de um presidente sem companheira, oriundo de terras caipiras. Além de completar com a ideia do que representava o jogo de poder no período: uma verdadeira brincadeira como peões no tabuleiro de xadrez.
(1) FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Rodrigues Alves: Apogeu e Declínio do Presidencialismo. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora/São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1973. p. 204.
Imagem: Revista “O Malho” – nº 71 – 1902 – Acervo Biblioteca Nacional.