domingo, 26 de agosto de 2012

Colóquio Preservação de Documentos

Aconteceu no dia 17 passado, no Centro de Documentação e Pesquisa Histórica (CDPH), da Universidade de Taubaté, sob a coordenação de Joaquim Roberto Fagundes, o Colóquio “Preservação de Documentos”, com o objetivo de abrir discussões em torno do assunto para o Vale do Paraíba. Isto por que a região possui um número considerável de instituições culturais com acervos expressivos da cultura material e imaterial, especificamente arquivos contendo fontes escritas e imagéticas. E todos sem o devido aparato técnico e instrumental para a sua guarda, conservação e disseminação.
E durante o evento, tomando como fulcro tal situação, foram levantadas algumas questões fundamentais acerca de identificar, sumariar, salvar e propor soluções teóricas e práticas para essas instituições, cujos documentos têm procedências e assuntos variados. Como também aspectos complexos e multifacetados.
O quesito principal que abriu a discussão foi o resgate e a réplica da informação intrínseca aos fundos documentais como objeto de preservação pouco discutido, analisado e sistematizado. Uma necessidade premente originária de experiências no campo da pesquisa, principalmente pela ausência de instrumentos de pesquisas capazes de responder de imediato as demandas dos cursos de pós-graduação. E da real importância das fontes como instrumento didático para o ensino de disciplinas específicas nos ensino público e particular, em todos os níveis de formação; notadamente na história. Daí a ideia de que a preservação estende-se além da sua proteção física, remetendo também para a criação de métodos e normatizações capazes de recuperar a maior quantidade possível de temas, assuntos, palavras e contextos inseridos em cada corpo documental ou processo individual. Uma conjunção de parâmetros, portanto, que contemple a ação de profissionais de diversas áreas, para a produção de repertórios completos que leve em consideração as características da produção dos documentos brasileiros desde o século XVI. Acrescido do conhecimento prévio das instituições governamentais portuguesas e brasileiras (funcionamento, tipologia dos seus agentes e correlações verticais e horizontais). Com tal perspectiva e consequente aplicação, tal como um laboratório, haveria a possibilidade de elaborar projetos de disseminação e replicagem das informações, ampliando, desse modo, a abrangência do uso documental por todos os níveis da sociedade; seja institucional ou não. A baliza é que o Vale do Paraíba é um extenso celeiro para aplicabilidade de um projeto dessa natureza.
Outro aspecto abordado foi a precariedade dos arquivos na região, presentes notadamente nos museus, aonde a preocupação com fontes escritas não chega a ser o ideal em termos de conservação e objeto de ações concertas. No mínimo a realidade consiste em apenas arranjo e descrição de forma precária (instalações em prédios impróprios, suportes e equipamentos de arquivamento e de trabalho inadequados), ausência de recursos financeiros, técnicos e de mão de obra especializada e cursos técnicos. Falta de apoio governamental, desconhecimento da legislação pertinente ao amparo dos acervos, mecanismos de incentivo cultural e formatação de projetos. Além da completa inexistência de planos arquivísticos contemplando missão, objetivos e instrumentos de ação que possam nortear o trabalho contínuo de instituições dessa natureza.
E ainda neste aspecto, foi suscitada a falta de uma decisiva política de ação educativa em arquivos, o que, entre outras coisas, se existisse, poderia elevaria o nível de consciência de conservação do patrimônio regional por parte da sociedade ou comunidade. Proporcionando também a elaboração de mecanismos e parâmetros complementares das fontes e sua aplicabilidade como instrumento de conhecimento da história, com recursos criativos, didáticos e lúdicos, como a elaboração de cartilhas, jornais e o uso da genealogia, etc.
Também foi relatado sobre uma política para a criação de arquivos municipais, gestão organizacional, administrativa e recolhimento de fontes. Nesse sentido foram evidenciadas as relações profissionais multidisciplinares e a inexistência na grade curricular dos cursos de história de disciplinas pontuais sobre fontes, acervos e arquívistica. Deste modo, o olhar do historiador na criação, gestão e organização dos dados seria fundamental.
Por último, foi evidenciada a necessidade de alguns órgãos culturais independentes, como o Instituto de Estudos Valeparaibanos (IEV) ter participação ativa na gestão e na preservação dos arquivos no Vale do Paraíba.
Em conclusão, o colóquio terminou com a proposta de outros encontros e colóquios sobre o tema, a criação de um grupo no facebook e a discussão sobre um levantamento sistemático de arquivos e fontes na região, com o intento de conhecer e fazer um diagnóstico real.

Imagem: Maurício Patolino (Taubaté-SP).

sábado, 18 de agosto de 2012

Retrocesso com o Patrimônio Documental Paulista

Ontem, eu e um grupo de professores, alunos estagiários e funcionários de arquivos e museus, durante colóquio que coordenei sobre preservação documental no Centro de Documentação e Pesquisa Histórica (UNITAU), falávamos da necessidade urgentíssima de um projeto amplo que possa realizar o levantamento, o resgate, a identificação, a descrição e o diagnóstico dos arquivos e fontes documentais do Vale do Paraíba. Fundamentalmente para salvar, preservar e recuperar documentos e informações deles emanados, para que os tenhamos sistematizado e disponíveis para acesso público, com rapidez e eficiência. E agora está aí uma notícia preocupante, por total falta de planejamento, ação, eficácia e alcance social: a terceirização de acervo judiciário por uma empresa internacional, sem vínculo e comprometimento com a realidade brasileira. E o que é pior sem o olhar, o auxílio e o acompanhamento multidisciplinar de profissionais ligados principalmente com a história paulista. O judiciário está navegando contra as atuais tendências de socializar o conhecimento pelo acesso irrestrito a verdades que dizem respeito a todo povo brasileiro. E nenhum órgão institucional ligado a cultura e ao patrimônio até o momento se colocou contrário para com a atitude do judiciário, o que demonstra o que sempre falamos sobre a política pública de arquivos: ainda está no chão. E no Vale do Paraíba precisamos fazer diferente. Daí a montagem de um grupo regional para cuidar dos nossos acervos documentais com toda a urgência.
Leia a reportagem publicada sobre o assunto, acessando

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Descaso com a Estação Ferroviária de Guaratinguetá

Está em completo abandono parte da primeira estação ferroviária de Guaratinguetá, datada de 1877 e que a Prefeitura Municipal negligenciou em restaurar e revitalizar para o público, como parte de um complexo cultural que no local poderia ser construído. Muita coisa já está perdida e a estrutura está praticamente comprometida; principalmente o telhado, em alguns pontos. Assim como descaracterizada.
Numa cidade onde impera o tradicionalismo convencional e insconciente, parece algo contraditório deixar acontecer algo semelhante. E tal forma tradicionalista e preconceituosa atrasa o desenvolvimento econômico e cultural do município, tendo em consideração o potencial turístico e as oportunidades, daí advindas, para a realização de um número infinito de projetos na área da economia criativa e, consequentemente, de inserção de mão de obra qualificada para tal fim, possibilitando a geração de empregos em áreas alternativas ao setor industrial.
Tal constatação, óbvia por sinal, faz com que façamos aqui uma sugestão: Em vez de distribuir "santinhos" com o seus nomes, números, partidos, dar bom dia, e tomar café com a população, porque os políticos não assinam publicamente, com documento reconhecido em cartório, um termo de comprometimento para cuidar dos bens culturais da nossa cidade (os galpões da estação ferroviária por exemplo). Com certeza vocês estariam colocando em prática a honestidade e retidão de caráter para com a população. Ou será que não existe coragem? Caso seja eleito e não cumpra, poderemos entrar no Ministério Público exigindo o cumprimento do seu dever público. Quem se candidata?

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

As Habilitações Sacerdotais Vita Genere et Moribus

As habilitações de genere destinavam-se à averiguação da legitimidade do requerente e da vivência dos ascendentes segundo os princípios da religião católica, da ocorrência da prática de crimes de lesa magestade, divina ou humana, da incorrência em infâmia pública ou em pena vil. A habilitação de genere era condição para o requerimento da prima tonsura. Os processos corriam perante o ordinário, ou perante o seu provisor e, ou vigário geral, ou perante um desembargador da Relação Eclesiástica como juiz especial (de genere), pelo arcebispo ou pelo cabido sede vacante.
As habilitações de genere são posteriores ao Breve "Dudum charissimi in Christo" do papa Xisto V, de 25 de Janeiro de 1588, que proibia o provimento do benefício em pessoas com ascendência de cristãos novos. Em 1773, passaram a observar as Constituições do bispado da Guarda, pela Lei de 25 de Maio. Em 1779, o provimento do cargo eclesiástico foi alargado aos cristãos novos e a descendentes de turcos, judeus, e gentios, provado o seu bom comportamento, com excepção dos filhos ou netos de pessoa que tivesse cometido crime de lesa magestade divina ou humana, ou regressado ao judaísmo, de acordo com o Breve "Dominus ac Redemptor noster", de Pio VI, datado de 14 de Julho.
Para se iniciar a habilitação de Genere era preciso que o habilitando depositasse na Câmara, a quantia necessária para as despesas das diligências, sendo-lhe passado um recibo, assinado pelo tesoureiro dos depósitos da Câmara, e pelo juiz das justificações de genere, ou pelo escrivão da Câmara. Desde 1842, os recibos eram assinados pelo tesoureiro da Mitra. O recibo fazia parte da instrução do processo e nele constava o número do livro dos depósitos da Câmara e o número do assento correspondente.
O processo de habilitação iniciava-se com a petição do habilitando dirigida ao bispo da sua diocese, onde constava a filiação, a naturalidade dos pais, os nomes e naturalidade dos avós paternos e maternos, destinando-se o processo a justificar estas declarações. Sendo necessário fazer diligências noutra diocese, o juiz das habilitações de genere enviava ao respectivo ordinário, uma precatória ou requisitória de habilitação. Da instrução também faziam parte a comissão da habilitação dirigida ao vigário da vara, se a diligência ocorresse fora da jurisdição do processo, o mandado deste para o pároco da freguesia de naturalidade do habilitando, e de seus ascendentes, a inquirição de testemunhas e certidão das declarações feitas, as certidões de baptismo do habilitando e de seus ascendentes, as certidões de casamento dos pais e avós, podendo ainda constar as declarações dos ofícios dos pais e avós paternos e maternos, as cartas de compatriota, entre outros documentos. A sentença dada em relação, confirmava a informação do habilitando. Se a quantia depositada excedesse as despesas das diligências, o depositante era reembolsado, assinando o recibo que ficava no processo. O juiz das justificações de genere aprovava as contas do processo.
Nos dias atuais ainda é sobretudo utilizada para pesquisa genealógica, como fonte alternativa importante para encontrar os ascendentes de inúmeras famílias de São Paulo. Por constar documentos provando origens e depoimentos de testemunhas ligadas ou não parentalmente ao candidato; determinando residências e descrevendo conduta e vivência dos pais e avós. Incluido, da mesma forma, escrituras de doação de patrimônio material; item exigido para a habilitação, constituido em boa parte por terras e casas.
Para o Vale do Paraíba, os fundos constítuidos por habilitações encontram-se concentrados em três locais específicos: os arquivos das Cúrias Metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro e Mariana, em Minas Gerais. E se constitui num rico acervo para os estudos nas áreas de História Social, ciências da religião, genealogia, entre outras.
No arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo está depositada a maior parte das habilitações de padres da Ordem do Carmo (quase nada sabe-se sobre ela), que exerceram funções no Vale do Paraíba; datados a partir da segunda metade do século XVIII, com instrumento de pesquisa em ordem alfabética do habilitando.
No Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, embora ainda não organizados completamente, existem habilitações mais antigas, tendo em vista que a referida cúria foi criada bem antes da cúria de São Paulo. Lá encontram-se processo datados do íncio do século XVII, muitos deles de sacerdotes oriundos da região da cidade de São Paulo, cujas famílias posteriormente estabeleceram residência no Vale do Paraíba; muitos deles com biografias desconhecidas. Possui índice informatizado a cargo dos funcionários.
Na cidade de Mariana, encontram-se processos de habilitandos cujas as famílias anteriormente estavam estabelecidos em regiões de São Paulo e datam a partir do século XVIII.
Portanto fundo importantíssimo para conhecer a origem, vida e atuação dos padres no Brasil, principalmente no período colonial e a vida social dos envolvidos nos processos. Bem como outras possibilidades de pesquisa no Vale do Paraíba.
Desenho: representação imagética de uma árvore genealógica na Idade Moderna.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Dinâmicas centrípetas e centrífugas na formação do Estado monárquico no Brasil

O presente artigo compartilhado, possui interesses múltiplos; e especificamente para o Vale do Paraíba pode ter significado pelo objeto de estudo e métodos de abordagem. Vale lembrar que poucos estudos existem sobre a política na Capitania e Província de São Paulo no século XIX e a leitura do texto indicado serve como referência.
Além disto, existe uma documentação infinita neste sentido, principalmente no Arquivo Público do Estado de São Paulo. Entre tantas fontes citamos o fundo "Ofícios Diversos", que começa em torno da década de 1820 e se estende por quase todo o século XIX, trazendo toda as interlocuções entre o Governo da Província e os munícipios. E nos arquivos da região destacam-se as "Atas da Câmaras Municipais", conjunto que reflete questões amplas sobre administração e política locais; embora nem todos os municípios atuais possuam tais fundos.
Revista Brasileira de História - Dinâmicas centrípetas e centrífugas na formação do Estado monárquico no Brasil: o papel do Conselho Geral da Província de São Paulo

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Francisco de Assis Barbosa – Um guaratinguetaense para Resgatar

O guaratinguetaense Francisco de Assis Barbosa, membro da Academia Brasileira de Letras, foi um dos grandes nomes do jornalismo brasileiro a partir da década de 1940 no Brasil. Conheceu homens do seu tempo e nas mais diversas áreas onde atuou; da política ao jornalismo, biógrafo de Lima Barreto e diretor da Casa de Rui Barbosa, entre tantas outras funções atividades que exerceu até a sua morte.
Como que para resgatar sua história e produção literária, fazemos aqui uma Campanha para dar vida ao homem público que muito contribuiu para a cultura brasileira; esquecido pelas gerações atuais.
Entre as tantas atividades exercidas por Francisco de Assis Barbosa, fulgura-se a de jornalista, escrevendo nos principais jornais do país, notoriamente os publicados diariamente no Rio de Janeiro, onde residiu até a sua morte. Foram inúmeros os artigos em colunas diárias ou semanais, muitos dos quais se transformaram em livros.
É o caso de “Homens não falam demais”, em parceria com Joel Silveira, editado pela antiga Companhia Editora Leitura, do qual possuímos 2ª edição (com ex-libris de José Carlos de Macedo Soares) datada de 1945, onde faz uma homenagem dedicatória a Samuel Wainer, seu companheiro de jornalismo e, mais tarde, um dos baluartes da imprensa com o jornal “Última Hora”, criado no segundo período Vargas, graças ao trabalho em prol daquele político nas eleições de 1950, quando ainda trabalhava para Assis Chateaubriand.
Trata-se de uma série de entrevistas realizadas por ele e por Joel Silveira com alguns nomes destacados do cenário brasileiro na primeira metade do século XX; entre eles, também, pessoas comuns.
Francisco de Assis Barbosa aparece com 10 entrevistados e Joel Silveira, com doze. Entre os destaques da entrevista aparece J.J. Seabra, político bahiano que exerceu inúmeros cargos públicos, entre eles, Governador da Bahia e Ministro da Justiça, no Governo Rodrigues Alves. Villla-Lobos, maestro de renome, e Augusto Frederico Schmidt, poeta e empresário, amigo dos modernistas e ele mesmo, um dos principais artífices do movimento.
Vale a leitura por seus aspectos de reminiscências, tiradas dos entrevistados com grande habilidade de jornalista que possuía.

sábado, 7 de julho de 2012

164º Aniversário de Nascimento de Rodrigues Alves

Em 07 de julho de 1848 nascia em Guaratinguetá Francisco de Paula Rodrigues Alves, Conselheiro do Império (1888) e Presidente da República (1902-1906).
E nada melhor,... na data natalícia de um filho da terra, do que cobrar das autoridades uma posição a respeito do Museu que leva o seu nome, e conserva sua vida e memória através de objetos, documentos e outras peças.
O prédio está pronto, restaurado, e a museografia diferente e impecável, então porque deixar fechado. Por diferenças políticas e por exigir troca de favores. É um absurdo.
Portanto, fica registrado um ato de repúdio aos homens da política que nunca tiveram interesse em preservar a nossa história, caminhando contra a maré, num país onde está ocorrendo mudanças sensíveis nesse sentido. Daqui a cem anos a memória desses políticos estará esquecida, assim como se esquece do Museu Conselheiro Rodrigues Alves. E garanto que o ego expressivo deles não estará feliz com essa perspectiva de estar deixado no chão da história. Se não houver modificação na mentalidade torta desses homens o que será desse país. O povo precisa reagir.

domingo, 3 de junho de 2012

Historiadores Pra quê? – Grupo de Estudos no Facebook

Uma pergunta que sempre permeou as atividades do historiador – Historiadores Pra quê? – hoje está se constituindo numa preocupação cada vez mais presente na sociedade, por uma série de razões, principalmente pela certa dose de popularização da história entre o público leigo. Notadamente por obras com linguagem acessível, como o caso da historiadora Mary Del Priori e de outros; mesmo que não profissionais da área.
Mas como a ciência histórica é fruto de seu tempo, como já disse um historiador ainda na segunda metade do século XX, a abordagem do tema é muito ampla, se tomadas pelo ponto de vista do papel social do historiador frente aos desafios do século XXI. E, novamente, a reflexão sobre o verdadeiro papel da história e dos seus protagonistas está em voga, como se constata por algumas notícias e publicações. A começar, entre outras, pelo vigor da discussão nos Estados Unidos, publicada recentemente.
Neste sentido, não poderíamos deixar de participar e colaborar de alguma forma, principalmente pelas experiências que possuímos na região do Vale do Paraíba, e para tanto, criamos a página “Historiadores Pra quê?” na rede social facebook, com o objetivo de disseminar informações, discutir e preparar encontros que possam enriquecer um debate mais amplo. O nome do grupo tem origem no artigo da Professora Keila Grinberg, professora da Universidade Federal Fluminense, na revista “Ciência Hoje”, sob o mesmo título.
Eis a transcrição do texto:

Historiadores pra quê?

“À luz do debate que sacode o campo de história estadunidense sobre a função social dos historiadores, Keila Grinberg contrapõe, em sua coluna de março, as expectativas do graduando em história no Brasil e a realidade que ele encontra depois de formado. A reflexão sugere um novo direcionamento profissional nos cursos de pós-graduação na área.
Pergunte a qualquer estudante de pós-graduação em história no Brasil o que ele quer ser quando defender, e a resposta vai ser quase sempre a mesma: professor universitário. Nos Estados Unidos também é assim. Mas a realidade dos doutores recém-formados tem sido bem diferente da expectativa. Com a crise econômica, a maioria, quando acha emprego, acaba trabalhando em museus, escolas e outros lugares tidos como de menor prestígio.
A redução de vagas no mercado de trabalho universitário para a área de humanidades – o que, aliás, acontece nos Estados Unidos desde a década de 1970 – é a provável razão por trás da grande discussão sobre os programas de pós-graduação em história e a função social dos historiadores que está sacudindo o campo desde outubro do ano passado naquele país. Ainda que a motivação seja mesmo esta, ela está vindo para o bem.
Em outubro de 2011, Anthony Grafton, presidente da Associação Americana de História, e Jim Grossman, diretor-executivo da entidade, escreveram o artigo “No more plan B” (Não mais plano B, em tradução livre), defendendo que as chamadas carreiras alternativas, principalmente no campo do ensino e da história pública, não deveriam ser mais o plano B dos recém-doutores na área de história, mas sim o caminho principal. E isto não apenas porque falta vaga no mercado, mas porque os historiadores devem rever a sua relação com a sociedade, deixando de ver a si mesmos apenas como profissionais que pesquisam e ensinam dentro da universidade.
O artigo caiu como uma bomba no meio acadêmico. Houve quem criticasse, dizendo que Grafton só defendia essas ideias por ser, ele próprio, professor de Princeton, uma das universidades de pesquisa mais prestigiadas dos Estados Unidos. Mas prefiro entrar na fila dos que aplaudiram, como Claire Potter e Thomas Bender, ambos professores da Universidade de Nova Iorque.
De maneiras diferentes, os dois defendem uma mudança radical no ensino universitário de história: Bender, para recuperar o comprometimento dos intelectuais com a vida pública que marcou a formação universitária na área de humanidades no século 19; e Potter, para defender que o trabalho do historiador no século 21 deve ser feito em conjunto e acessível ao grande público, um modelo radicalmente diferente daquele do pesquisador solitário, em vigor no século passado, que escreve somente para seus pares.
Segundo Potter, os historiadores, para dar conta das novas tecnologias, das variadas formas de divulgação dos resultados de suas pesquisas, e para estar em dia com a produção acadêmica internacional, deve trabalhar em conjunto com outros historiadores. E isto vale também para o ensino e para um diálogo mais igualitário e engajado com o público (que, nas universidades do Brasil, poderíamos chamar de extensão).
Nisto não há muita novidade, a não ser a constatação, comum a ambos, de que o ensino
universitário de história está muito longe de prover as competências necessárias para que os recém-formados possam se adequar aos novos tempos do mundo real. As disciplinas existentes na maioria dos cursos de pós-graduação em história são orientadas tão somente para a especialização excessiva e para a pesquisa individual.

Perda total

No Brasil, estamos no mesmo barco. A diferença é que a Associação Americana de História acabou de se engajar em um grande projeto de reflexão sobre a profissão, que, nos próximos três anos, vai estudar e discutir os currículos de várias universidades dos Estados Unidos.
Enquanto isso, aqui, são pouquíssimos os cursos de graduação em história que têm disciplinas como “Patrimônio” ou “Relações internacionais” em seus currículos. Candidatos a historiadores pouco estagiam em museus ou em centros culturais. Mesmo a área de ensino de história na educação básica é frequentemente neglicenciada. O resultado disso é que a maioria dos graduados na área foge das salas de aula dos ensinos fundamental e médio e nenhum curso de pós-graduação se dedica a formar professores para a educação básica.
Dos 63 cursos de mestrado e doutorado existentes na área de história no início de 2012 no Brasil, , um dos quais especializado em bens culturais e projetos sociais. Nenhum é devotado ao ensino de história.
Para se ter uma ideia do contraste com outras áreas, existem hoje 72 cursos de pós-graduação no Brasil dedicados exclusivamente ao ensino de ciências – física, química, biologia, ciências da terra – e matemática, entre mestrado profissional (39), mestrado acadêmico e doutorado.
Da mesma maneira, a produção acadêmica resultante de trabalhos realizados em conjunto é frequentemente desvalorizada. Por decisão dos próprios historiadores, os livros didáticos – realizados necessariamente em equipe – não são considerados pela Capes como produção intelectual qualificada, item de fundamental importância na avaliação dos programas de pós-graduação.
O mesmo vale para textos escritos em parceria, principalmente se a coautoria for entre aluno e professor – há quem desconfie que ou o professor se aproveita do trabalho do aluno ou o aluno se aproveita do prestígio do professor para publicar – e para o conhecimento divulgado em outros meios que não a palavra escrita, como filmes e sites.
A flagrante competição entre os programas de pós-graduação – têm mais recursos e bolsas de estudos aqueles cujos professores têm produção acadêmica considerada mais qualificada – completa o quadro.
Daí não ser de espantar que a maioria dos pesquisadores da área de história só se dedique a escrever livros, artigos e capítulos para serem lidos por seus pares; que suas aulas sigam esse mesmo padrão; e que seus alunos tenham no horizonte apenas a restrita carreira acadêmica.
Seguindo esse padrão, perdemos todos: pesquisadores, professores e alunos; Perdem os programas de pós-graduação, viciados em produzir apenas o que é bem pontuado na avaliação da Capes; perdem os alunos universitários, que têm uma formação voltada para um trabalho que dificilmente exercerão e que deixam de ser qualificados em competências que fatalmente deverão desenvolver.
E perde o público, ávido por ler bons livros, ver bons filmes, frequentar bons museus e navegar em bons sites de história.

Keila Grinberg
Departamento de História Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
Pós-doutoramento na Universidade de Michigan (bolsista da Capes).

quarta-feira, 30 de maio de 2012

1ª Semana do Café - Casa da Cultura de Lorena

No último dia 24 de maio, na Casa da Cultura de Lorena, teve lugar a mesa redonda sobre a história do café no Vale do Paraíba, que contou com a participação de cinco pesquisadores da região paulista e fluminense. O evento, elaborado e coordenado pelo Instituto de Estudos Valeparaibanos – IEV abriu a 1ª Semana do Café, de iniciativa da Secretaria de Cultura e Turismo da cidade. E foi um sucesso, segundo aqueles que participaram da noite, entre eles os proprietários do comércio de café na cidade (patrocinadores da Semana), convidados da Universidade de Taubaté, representado na pessoa do Professor Mauro Castilho, responsável pelo CDPH da instituição, moradores da comunidade, funcionários da Casa da Cultura e o representante maior, o Secretário Caio de Andrade, a quem coube a ideia e a recepção dos pesquisadores da palestra.
A mesa de trabalho foi composta pelo Professor Júlio César Fidélis, vice-presidente do Instituto de Estudos Valeparaibanos e que dirigiu as apresentações da mesma; pelo Professor Marcos Cotrim, do Rio de Janeiro, membro do IEV; pela Professora Alexandra Morais, da Universidade de Taubaté, membro da mesma instituição; por Joaquim Roberto Fagundes, de Guaratinguetá-SP e também membro do IEV e pelo Professor Glauco Santos, professor da rede pública estadual e membro do IEV.
Cada qual falou de uma temática específica do período do café no Vale do Paraíba paulista e fluminense, quando transformações de caráter social, econômico e políticos trouxeram mudanças profundas no quadro histórico da região.
O professor Júlio César, o primeiro a falar, discorreu sobre o café na região fluminense, especificamente nas localidades próximas de Rezende e Itatiaia, mostrando dados que denotam outra realidade: a maior presença de pequenos e médios proprietários de terras e escravos, com relação aos grandes proprietários, os chamados “Barões do Café”. E a subida no preço do café, mesmo com a evidenciada crise do café em fins do século XIX e começo do XX.
O Professor Marcos Cotrim remeteu os presentes para a questão social do período, sobre escravos e proprietários. E Joaquim Roberto Fagundes discorreu sobre o reflexo do café nos documentos da época, mostrando as informações passíveis de utilização por historiadores e pesquisadores para escrever a história da região.
Os professores Glauco Santos e Alessandra Morais evidenciaram analogamente a questão da elite cafeeira na região, sob a égide dos titulares do império, barões, viscondes e conde. O primeiro falou sobre as visitas do Imperador ao Vale do Paraíba, principalmente nas cidades de Lorena, Guaratinguetá e Lorena, relacionando-os com a questão da hegemonia do império nas mãos dos grandes cafeicultores da região. E a posterior falta de apoio da mesma elite ao regime monárquico. E, por último, Alessandra Morais, falando a respeito dos barões do café da região de Taubaté, via jornais e outros documentos. Entre eles, os Viscondes de Tremembé e Mossoró.
E com um assunto puxando o outro, houve consonância e harmonia entre os temas, que agradou o público presente, fazendo com que o Secretário da Cultura e o presidente do IEV, Francisco Sodero Toledo, anunciassem para o próximo mês de agosto, durante os festejos de aniversário da cidade, outra rodada histórica do mesmo porte.
Foto: Benedito Matheus - Taubaté.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Aos Historiadores, Pesquisadores e Professores

O Vale do Paraíba precisa escrever e reescrever sua história. Sua importância transcende o local, marcando a História do Brasil. Nunca antes tivemos tantos profissionais a serviço da região. Em todas as áreas das ...ciências humanas é preciso investir na pesquisa de base, fortalecendo, com isso, a educação, a família e a comunidade.
A região possui qualificativos para tornar-se paradigma na pesquisa histórica, patrimonial e museológica. Temos acervos maravilhosos, cultura material e imaterial, gente competente, instituições de ponta. Agora é o momento para elevar o Vale do Paraíba ao patamar que merece. Temos que mostrar para que viemos. Não vamos perder o bonde da história. Escrevendo sua história, estaremos valorizando todo o patrimônio da região. Contamos com todos você.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Simpósio de História do Vale do Paraíba

O IEV, Instituto de Estudos Valeparaibanos, organiza há 40 anos o Simpósio de História do Vale do Paraíba congregando as regiões do vale paulista, do vale fluminense e das alterosas mineiras nos limites com a bacia do Paraíba do Sul.

Neste ano de 2012 o Simpósio acontecerá nos dias 08 a 11 de Agosto na Faculdade Canção Nova em Cachoeira Paulista. O tema a ser tratado será: "Vale do Paraíba: A memória do trem".

Cachoeira Paulista conta com patrimônio de valor inestimável relacionado com o transporte ferroviário: trata-se de estação, abandonada em estado precário, que serviu de baldeação em fins do Século XIX início do Século XX de pessoas e de mercadorias que percorriam a Estrada de Ferro D. Pedro II, vinda do Rio de Janeiro, e da Estrada de Ferro do Norte, que saía de São Paulo.

O XXVI Simpósio de História do Vale do Paraíba será oportunidade para apresentação de trabalhos acadêmicos com as mais variadas modalidades realizados por alunos de graduação e de pós-graduação, por pesquisadores que se interessam pela preservação da memória ferroviária e também para a defesa deste meio de transporte indispensável para o desenvolvimento do Brasil.
Prof. Dr. Henrique Alckmin Prudente
Presidente do XXVI Simpósio de História do Vale do Paraíba

domingo, 13 de maio de 2012

Museu H.P. Rodrigues Alves – Reabertura Urgente

Para mais de dois anos o Museu Histórico e Pedagógico Conselheiro Rodrigues Alves, localizado na cidade paulista de Guaratinguetá, está fechado para o público por inércia dos governos estadual e municipal. Um impasse devido a interesses políticos absurdos, que prejudica um patrimônio público de grande interesse para a região do Vale do Paraíba, para o Estado de São Paulo e para o Brasil.

Atualmente o prédio encontra-se restaurado na sua maior parte, com museografia impecável e um plano museológico elaborado e interessante. Mas corre o risco de deteriorar em seus aspectos mais importantes, principalmente o acervo, que é composto de mobiliário, iconografia, documentos pessoais e biblioteca particular do Conselheiro Rodrigues Alves.

Enquanto outros museus do Estado foram municipalizados com sucesso, funcionando a toda carga, em Guaratinguetá o Museu do Conselheiro e Presidente da República, Francisco de Paula Rodrigues Alves (1848-1919), está inerte, sem atividades, visitação e perdendo de colocar em prática, juntamente com a comunidade, um plano de ação educativa eficiente e modelar para a região. Não tem funcionários, uma administração adequada e corre o risco de perder muita coisa.
Urge fazer algo a respeito e denunciar flagrante descaso das autoridades públicas perante a memória, o patrimônio e a educação do país. É preciso deflagrar uma campanha para sua municipalização ou sua continuidade no Governo do Estado.

E uma solução, entre outras, seria o Instituto de Estudos Valeparaibanos – IEV, instituição regional fundada em 1973, encampar a ideia e vir a ser uma OS (Organização Social de Cultura), concorrendo junto ao Governo do Estado para ter contrato de administração e gerência do local. O que não seria tão difícil e temeroso, já que a proposta têm se mostrado eficaz na administração dos equipamentos culturais do Estado, a exemplo da Pinacoteca do Estado de São Paulo, o Museu de Arte Sacra, o Museu Histórico e Pedagógico Índia Vanuire, com sede em Tupã, e alguns outros espelhados pela cidade e Estado de São Paulo.

Não existe tempo para salvar aquele rico patrimônio e, portanto, pede-se que todas as entidades regionais e estaduais se solidarizem com a situação e pressione para a conclusão desse processo absurdo de fechamento por falta de interesse.

domingo, 29 de abril de 2012

Fundação do Núcleo IEV - Taubaté

Não haveria notícia tão auspiciosa e esperada que a formação do Núcleo Taubaté do Instituto de Estudos Valeparaibanos, isso porque conhecemos os méritos profissionais dos seus membros. São dedicados e com uma sólida formação acadêmica, expressa nas iniciativas a priori constantes.
Acredito ter sido um passo fundamental para os novos tempos do IEV, onde desafios e demandas serão a tônica para o enquadramento da instituição no paradigma de outras congêneres no país.
Toda instituição se renova em seus quadros filiais e principalmente em sua missão e objetivo perante ao público, como forma de responder aos interesses coletivos.
E, neste sentido, o núcleo de Taubaté terá papel decisivo e importante, atuando extensivamente na luta e realização de metas globalizantes para a região; seja na preservação, como na divulgação, mas principalmente na realização de projetos de políticas públicas amplas, entre eles os links basilares - universidade-escola-comunidade - com a inserção de linguagens acessíveis ao grande público. E que resultará na maior compreensão da realidade social, econômica e política do Vale do Paraíba, e bem assim, na melhor preservação do patrimônio histórico material e imaterial da região.
Não tenho dúvidas do sucesso a ser auferido pelo núcleo e sinto não estar presente em sua fundação. Mas estarei à disposição para contribuir com colegas de tão grande expressividade intelectual e capacidade de trabalho.

terça-feira, 24 de abril de 2012

Sangue de Portugal


A região do Vale do Paraíba situa-se nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, por onde passa o Rio Paraíba do Sul. É uma das regiões de mais antigo povoamento no Brasil, tendo sido ocupada a partir da primeira metade do século XVII. Em toda a sua história houve, quase initerruptamente, a chegada e o estabelecimento de homens e mulheres oriundos das inúmeras vilas e cidades de Portugal. O que significa dizer que somos parte de sua história e, por assim dizer, herdeiros de uma cultura rica e fascinante. Quase sempre, ao buscarmos a nossa história e genealogia, encontramos uma vila ou cidade de Portugal, na qual nasceu um dos nossos remotos antepassados.
Neste sentido, é um orgulho receber a visita de nossos patrícios nesse simples blogger. E, portanto, os brasões aqui estampados relacionam-se aos homens do nosso passado brasileiro com origem nessas cidades, bem como homens e mulheres das mesmas localidades que acessaram o blogger. Muito obrigado aos nobres amigos das terras portuguesas.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Padre Reconhece Paternidade no Óbito

Fonte: Arquivo da Cúria Metropolitana de Aparecida - Livro de Óbitos da Matriz de Guaratinguetá

 TRANSCRIÇÃO

D. Anna Roza do Sacramento, solteira, branca, idade de 31 anos.

Aos trinta dias de dezembro de mil oitocentos e quarenta e dois nesta vila, com todos os sacramentos de idade de trinta e um anos de malina, faleceu da vida presente Dona Anna Roza do Sacramento, branca, natural desta vila, solteira, minha filha natural e de Dona Mariana Francisca Romeira: foi seu corpo envolto em hábito dos Padres de São Francisco, conduzida em caixão, sepultada ao pé do altar mor em campa dos irmãos do Santíssimo donde era irmã, acompanhada pelo Reverendo Francisco Marcondes de Siqueira e por todos os reverendos sacerdotes que se achavam nesta vila, da Capela de Nossa Senhora Apparecida, que todos lhe disseram missa de corpo presente, e se lhe cantou na rua cinco mementos com música, e também foi acompanhada pela Irmandade do Santíssimo Sacramento e de São Benedito, sua alma foi recomendada, do que para constar fiz este assento, que assinei. O Vigário Manuel da Costa Pinto.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Centenário do Gênio Mazzaropi

Não existe um ator que melhor expressou a nossa cultura regional do que Amácio Mazzaropi, o eterno Jeca inspirado em Monteiro Lobato.
Sua genialidade não está somente na brilhante carreira como ator e diretor de cinema, mas, sobretudo por sua erudição e talento em transformar ideias em elementos palpáveis do cotidiano. Como ninguém, ele trouxe o pensamento de épocas distintas para a linguagem do público e por isso sobrevive como um representante de uma classe em extinção: de homens astutos, sem preconceito e com uma identidade que transcendeu em vida sua origem italiana. Um verdadeiro cosmopolita, que aceitou e interagiu magnificamente com o povo brasileiro, com filósofos e com o homem simples do meio rural. O ator que pelos atos bradou “Viva o povo brasileiro”.
Prova disso, o famoso “Candinho”, uma síntese entre o homem de herança colonial, com sua sabedoria pela experiência de vida, e Voltaire, pela personagem homônima “Cândido”; a pureza no acreditar nas pessoas e de que na vida tudo acaba da melhor forma possível.
Mazzaropi equiparou-se com o grande mestre Monteiro Lobato, e foi além, ao elevar conceitos implícitos ao nosso viver, dando-lhe importância acima dos preconceitos. Um mestre que nos fez e faz raciocinar.
Nossa homenagem ao Centenário do seu nascimento, com sua imagem eterna, confirmando que sua sagacidade é para além dos séculos.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Apoio e Solidariedade - Revista de História

Externo e pontuo solidamente minha solidariedade e apoio ao editor Luciano Figueiredo e ao Conselho Editorial da Revista de História da Biblioteca Nacional diante da situação escabrosa que atualmente contaminou umas das mais brilhantes revistas da área histórica brasileira. E abomino as condições impostas por políticos que infelizmente infestam as grandes instituições culturais do país, seja pela ignorância em gerir equipamentos culturais, ou pela falta de formação, informação, espírito de equipe e visão. A sociedade exige de todos nós, profissionais da área, um posicionamento imediato, no sentido de apoiar aqueles que sempre lutaram pelo patrimônio brasileiro.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Uma obra de Paulo Pereira dos Reis

A série intitulada “Brasiliana”, publicada durante décadas pela Companhia Editora Nacional, foi baluarte na divulgação de estudos brasileiros, existindo entre as obras da coleção algumas raridades que jamais tiveram uma segunda edição. E o site Brasiliana Eletrônica, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, tem se esforçado para disponibilizar para os internautas toda a coleção, contando atualmente com 119 obras disponíveis online (www.brasiliana.com.br ), nas áreas de formação histórica e social do Brasil, etnologia, folclore e brasilianistas, etc.
E dentre os mais de trezentos volumes publicados encontra-se a obra ensaística do historiador valeparaibano, Professor Paulo Pereira dos Reis, natural de Lorena e membro da Academia Paulista de História; que deixou um vasto repertório de publicações e inéditos sobre o Vale do Paraíba colonial.
Por essa obra, pouquíssima conhecida do público acadêmico e leigo, vê-se a importância e a seriedade do profissional que dedicou sua vida ao resgate da história, num tempo específico, pautada na verdade objetiva e na documentação inédita existente em vários arquivos do país. E que teve o reconhecimento além fronteiras por esse escrito intitulado: “O Colonialismo Português e a Conjuração Mineira”, volume 319, 1964.
O livro vem prefaciado por T.O. Marcondes de Sousa e apresentado por J.F. de Almeida Prado, (bibliófilo, historiador, jornalista e escritor paulista) com apêndice interessante sobre Tiradentes perante os historiadores, externando algumas opiniões colhidas pelo autor em inúmeras biografias, e uma carta de J.B. Mello Souza (Malba Tahan), com referências ao trabalho e os seus significados para os estudos históricos no que concerne a colonização portuguesa e as reações a ela adversas no século XVIII.
O autor parte do Mercantilismo europeu, explicando sua lógica e os interesses econômicos da burguesia no Renascimento e a busca de novos caminhos de enriquecimento em terras do Novo Mundo, passando pelas dificuldades de colonização do Brasil e o incipiente mercado de exploração do pau-brasil e o retorno governamental para as atividades agrárias. E dedica um capítulo especial do papel e sobreposição da Inglaterra sobre Portugal; bem como o período minerador no Brasil, no que concerne a espoliação exercida pela Coroa através dos regimes fiscais consolidados no século XVIII, culminando com a Inconfidência Mineira.
E por último, em especial, um capítulo interessante sobre a industrialização e a difusão da cultura no Brasil Colonial, colocando pontos específicos sobre as restrições impostas por Portugal na segunda metade do século XVIII ao comércio da colônia com outros centros importadores e que consideramos como importante item de pesquisa para o Vale do Paraíba, já que estudos nesse sentido são quase inexistentes, sobretudo nas suas consequências sobre a região.
Portanto, uma obra que merece uma reedição comentada e atualizada por especialistas da área de Brasil Colonial.  E que prova a urgente necessidade fazer um colóquio sobre sua contribuição para os estudos regionais e para a compreensão de suas ideias acerca da formação social do país pela ótica de estudos de casos e ensaios.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Ruth Guimarães – Roteiro de Vida

Nunca é demais se lembrar da querida escritora Ruth Guimarães, um símbolo da literatura brasileira pela originalidade e pela força de expressão. Um ícone cultural vivo que representa e resgatar os usos e costumes da região valeparaibana. E assim, é interessante ressaltar rapidamente um pouco de suas ideias, no sentido de chamar atenção sobre sua produção literária e sua contribuição para a história.
Numa publicação de março de 2008, da Revista Negras Palavras, edição nº 2, produzida pelo Museu Afro Brasil, a escritora explicita sua maneira peculiar de entender a literatura e como produz suas obras através de sua visão e experiência das coisas. Um jeito de Brasil interiorano, com refinado tom de especialização e inúmeras marcas de um passado que transcende ao pouco o nosso conhecimento sobre a região.
Chamam atenção no depoimento, dentro do projeto “Roteiros de Vida”, dois pontos importantes e intrinsecamente ligados com a história.

O primeiro deles sobre a língua portuguesa e o segundo sobre o seu posicionamento frente ao conjunto de sua obra. A autora é enfática ao alertar sobre a necessidade de aprender bem a língua pátria, recomendado aos novos escritores algumas atitudes fundamentais para o exercício da literatura. Diz Ruth: “se alguém vai escrever um livro, que leia os bons autores, que assista aos bons filmes, que converse com gente que sabe falar [...] emocionalmente a pessoa tem que estar apta”. Ou seja, é fundamental para aquele que se aventura nos mundos das letras conhecerem as diversas produções culturais da humanidade, como forma de conhecer as mais diversificadas linguagens. O português expresso e escrito corretamente é condição expressa para transmitir ideias compreensíveis para o público, através de uma linguagem fluída, independente do estilo.
Sobre a produção literária e sua relação com o público leitor e a educação no Brasil a escritora dá sua opinião, reverberando verdades incontestáveis: “nós brasileiros estudamos literatura de uma forma desorganizada; a gente ler o que quer .... os professores dão um texto aqui, outro ali, nada sistematizado, com um sentido e programação. Quando chegamos ao fim [...] temos uma formação mista; assim como somos um povo mestiço [...] a nossa literatura também é toda feita de pedaços de textos, de arrumações aqui e ali. Não há nada que nos torne inteiriços, inteiros.” E arremata “ como eu sou brasileira, nesse sentido de brasileiro todo um pouco para lá, um pouco para cá [...]” (p. 41)
E finaliza destacando a necessidade de uma literatura negra, chamando a atenção para a necessidade de que é preciso conhecer a raiz negra de onde viemos e que a história negra está por fazer, e que está pesquisando e tentando fazer um fabulário brasileiro, não somente entre negros, mas entre o povo (p. 42).
Sobre sua obra prima “Água Funda”, diz ser a obra o resultado dos acontecimentos na vida de cada um. E sublinha: “o que deu magia ao meu livro foi a minha atitude diante da vida. Isto é a minha magia” (p. 42). E a “ideia que eu tive [de] escrever de um jeito que os outros não estavam escrevendo”. O resultado segundo ela, um livro de “linguagem mais simples, mas sem perder a estrutura do portugues” (p. 43).
Somente pelas poucas ideias aqui destacadas se vê a profundidade de seu conhecimento; o seu discernimento e a sua conduta diante da vida e da literatura. Não é preciso dizer mais nada.

Referência: MUSEU AFRO BRASIL. Dois dedos de prosa. In: Negras Palavras, ed. 2, mar. 2008, p. 40-44.
Imagem: jornalolince.com.br (acessado em 03 de abril de 2012)

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Profissões Mecânicas e Estratégia de Inserção Social no Brasil Colônia

Algumas profissões do passado tiveram sua importância, além do propósito estritamente financeiro, se considerar o contexto social mais amplo pela via das redes de sociabilidade existentes na sociedade colonial Brasileira.
A afirmação, a principio, origina-se da observação empírica durante inúmeras pesquisas em textos documentais do final do século XVIII e da primeira metade do XIX, a exemplo paradigma indiciário; o que suscita alguns comentários.
Na convivência diária de homens e mulheres da colônia existia um complexo sistema de redes de relacionamento e que transcendia a mera troca de favores e dependência social, política e econômica e que definia estratégias de sobrevivência dentro daquela sociedade marcada principalmente pela preocupação de manter, em escala macro, as diferenças entre os estratos sociais. E dessa forma os signos que permeavam as relações sociais ainda estão longe de serem compreendidos com maior profundidade.
O que se vê, pelos rastros e definições de parentesco, profissão e depoimentos nos processos cíveis, é que existia uma reciprocidade maior, que em alguns casos indica a inexistência da rigidez que a historiografia apurou haver entre os níveis sociais de relacionamento, e que solidificou a ideia de uma pirâmide social estanque, posto em evidência existir somente o binômio senhor e escravo sem levar em consideração uma maioria populacional que interagia de diversas formas na complexa sociedade colonial.
As fontes documentais indicam, pelo menos em grau de percepção, terem existido inúmeras estratégias, muitas delas pontuais, dependendo da natureza de cada conflito levado a juízo, o que insidia principalmente em tomadas de posturas entre grupos parentais, diferentemente da lógica de defesa de grupos familiares com consangüinidade mais evidente.
Nesse sentido, não haveria apenas uma mera proteção ou relacionamento passional e profissional estritos, notoriamente no que se refere às camadas pobres e sua simbiose com grupos que exerciam cargos da governança militar e administrativa.
O jogo de interesses entre as partes caracterizava-se pela via de mão dupla, dependendo de cada caso em menor ou maior grau na troca de privilégios. Porque, embora pudesse haver ascendência do grupo minoritário privilegiado sobre a maioria, não significava que não houvesse mínimas estratégias do minoritário ter à sua disposição elementos para manipular e garantir a necessária sobrevivência á guisa dos grupos mais abastados no poder, principalmente nas situações de conflitos entre homens do mesmo grupo, onde entrava em cena homens de pouca importância econômica, com a intenção de defender interesses daqueles que lhes serviriam de garantia no futuro, mesmo que significasse incorrer em erros ou dar falso testemunho sob juramento dos evangelhos.
E nesse aparente perfil indiciário, a estratégia da informação parece ter um significado e sentido mais amplo no bojo da convivência mutua entre os níveis de relacionamento, tornando-se, por assim dizer, em elemento privilegiado de controle social para sobrevivência e as profissões chamadas “mecânicas” seriam emblemáticas nesse contexto.
As designadas profissões mecânicas eram as exercidas pela camada pobre da comunidade, como o carpinteiro, o serralheiro, o ferreiro, o taberneiro, o seleiro, o arreador, entre outros. E suas atribuições públicas, ou seja, o trabalho que oferecia a outros, lhes davam a oportunidade do contato com as mais diferentes pessoas e, portanto, obter informações detalhadas, diversificadas e privilegiadas dos acontecimentos, mesmo que público e notório fosse. O local de trabalho dessas personagens obscuras seria ponto privilegiado de encontro social e político durante o século XVIII e XIX, a exemplo das farmácias e das missas nos finais de semana no inicio do século XX em várias cidades pelo interior do país.
O elemento confiança nesse sentido seria negociado em forma de troca de favores. O profissional mecânico teria sua recompensa e, por sua vez, os outros elementos poderiam contar com informações necessárias para vigiar, controlar e criar situações convenientes para cada situação. Mesmo que para o grupo de profissionais mecânicos não houvesse economicamente única e exclusiva dependência em relação aos grupos minoritários, pois o tipo de trabalho por eles exercido era estritamente indispensável a todos, embora os parcos ganhos ou mesmo a sua vinculação ao proprietário de rancho de tropas e tendas de ferraria, dos quais recebiam pelo trabalho.
A importância desses profissionais, além da utilidade pública, estaria no predomínio e no privilégio da informação, à qual era obtida na convivência do cotidiano através dos diálogos e contatos com grande parte da população, que lhe proporcionava conhecimento da vida de todos os moradores, com acesso à vida privada, as intrigas pessoais e familiares, os amores, a vida e a morte.
Em grande parte das contendas transformadas em processos judiciais vêem-se depoimentos de testemunhas, em parte oriundas desse círculo de profissionais de baixa renda. E a conclusão que preliminarmente se chega é que nesses termos o conhecimento adquirido no cotidiano por esses profissionais se traduzia, também, em forma de reconhecimento social, como detentor de “segredos de confessionário”. Informações essas que poderiam configurar em troca e negociação, até mesmo por motivos de suborno pelo controle social e poder, mas que não assegurava ao grupo minoritário ascensão social e privilégios sejam por intermédio de cargos militares e públicos ou por casamentos com as famílias importantes.
Naturalmente, que para se conhecer melhor como se davam tais relações é necessário um estudo sério de casos, avaliando cada contenda, o que as várias testemunhas disseram sobre fatos ocorridos, se houve coação, falsas declarações, entre outras variáveis.
Um indicio para pesquisa, utilizando os processos cíveis como fonte privilegiada e inédita.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Voltando para a Escrita da História – Parte II

Reconstruir o passado, dando-lhe características de ciência histórica, com base em modelos explicativos, com coerência no desenvolvimento na tessitura social, econômica e política, ou mesmo que com base memorialística e narrativa, é algo específico e gratificante. Trabalha-se com conceitos, categorias e ideias, abstraindo informações acerca do que pouco se conhece. Mas seguir o caminho como agente do seu próprio viver no cotidiano real, é outra realidade, completamente diferente da primeira assertiva, pelo menos em principio.
Tem-se, então, um mundo bipartido, mas relacionado entre eles, com passado e presente interagindo constantemente. No primeiro caso se procura fugir do juízo de valores acerca dos fatos estudados, havendo apenas intervenção da abstração mental. No segundo caso, vive-se a vida envolvendo-se na tessitura social em que se está inserido, onde se julga, manipula-se, usa-se de diplomacia, muda-se ou acomodasse no cenário da sobrevivência. Faz a sua história.
No longo e tenebroso inverno, decorridos a partir de maio de 2011, pelo qual o autor faz um mea-culpa, o segundo caso foi tônica pessoal que mereceu maior atenção do responsável pelos textos aqui apresentados. Nesse ínterim, a maior parte das resoluções foi dedicada a problemas de cunho pessoal, solvente por viagens necessárias e reflexões sobre novos caminhos profissionais a tomar, ficando o mundo da história abstrata em segundo plano. Portanto, uma explicação pela ausência prolongada de novos textos.
Mas a relação desse aparente mundo bipartido esteve presente em todos os aspectos pelo sentido treinado do olhar e da mente, sempre ativa para a história, mesmo que ocupado com generalidades da vida. E se deu como a revelação de que não existe a morte da história, sempre retomada, nesse caso específico, pelas leituras rarefeitas, específicas da área, e na dedicação maior para a leitura ficcional, de produção nacional e estrangeira. A história no sangue, abstrata e real, pelas leituras realizadas como escape da realidade. O sempre retorno e atenção em torno da história pelos livros.
A primeira das obras, remetendo de volta para a história, “Memórias de um Sargento de Milicias”, obrigatória na escola, fez descobrir ser aquele texto fundamental para o Brasil da primeira metade do século XIX, como também importante para perceber o quanto a história e a literatura é próxima, principalmente pela percepção mental na elaboração da mesma, pois o autor estava inserido em sua época e, portanto, influenciado pelo imaginário. Nesse sentido, ainda há muito a ser discutido na relação do ficcional e a história praticada nas academias.
A outra, o clássico “Cândido”, do irreverente Voltaire, que parece ter sido uma necessidade espiritual implícita e sem consciência, fez pensar na atualidade da obra do filósofo, um tanto esquecido na atual conjectura. A inocência de acreditar num ser superior em contraponto com um destino traçado no formato de boas intenções acerca de que tudo se resolverá da melhor maneira é algo presente no cotidiano como necessidade espiritual diante da materialidade sempre reiterada pela história, ao sabor de cada época. Exemplo magnífico disso é a adaptação cinematográfica da obra pelo gênio Mazzaropi. O homem rural, com sua herança típica das raízes coloniais e com uma maneira própria de viver nos trópicos, refletida consistentemente na realidade brasileira em plena década de 1950, sendo a vida e o imaginário baseado em muito dos valores presentes na obra.
A “Volta em Mundo em 80 Dias”, do sempre Júlio Verne, foi outro momento para observar o quanto a leitura de sua obra é leve e divertida, dando a conhecer de forma prazerosa os costumes e a história do povo britânico, situada no período do progresso científico do final do século XIX e começo do seguinte. Novamente, pela história, deu-se a necessária atenção para a discussão atual sobre as mudanças na linguagem escrita da história, adaptando-a para maior público, principalmente no que diz respeito às novas produções historiográficas, a exemplo do que tem feito alguns jornalistas, muito embora, quanto a estes, se tenha ressalvas quanto ao modo e as informações contidas em suas obras. Quem escreve precisa socializar o conhecimento da história.
E outras obras, como a releitura das “Recordações do Escrivão Isaías Caminha”, do inconfundível estilo de Lima Barreto, que dá a certeza de que a história dos que passaram incógnitos pela vida é significativa, retratando a inserção daqueles em determinado contexto de época. É fundamental a releitura histórica sem dar única exclusividade para os grandes modelos explicativos com bases marxistas e estruturalistas, mas dialogar com macro e micro, pautado principalmente na multidisciplinaridade, a exemplo da antropologia e da sociologia, entre outras.
Por último, no presente momento, a coragem e aventura de ler “Crime e Castigo”, do russo Fiódor Dostoévski, motivada pelas afirmações do historiador italiano Carlo Ginzburg, como forma de tomar a literatura, por suas personagens complexas, como referencial para procurar entender as imbricações de cada acontecimento entre eles e a ordem geral estabelecida, ou na essência, analisar determinados aspectos, compará-los e relacioná-los com modelos explicativos gerais, como faz a micro história.
Assim, o mundo bipartido qualificado no inicio é uma essência única, da qual não há dissociação e com isso o retorno para a escrita da história ser inevitável, para incentivar, demonstrar e levantar questões. As leituras, juntamente com o trabalho para resolver assuntos pessoais, deram a noção exata de que é sempre preciso voltar para a história e compartilhar o que aprendemos pela escrita. A necessidade de esquecer, por vezes, os problemas, indicou o caminho da leitura e desta para continuar dizer algo para os amigos. Continuará.