O Rio Paraíba e o vale por ele formado em centenas de anos
sempre foram um velho conhecido dos andejos sem lar, dos migrantes coloniais em
busca de novas oportunidades, dos viajantes estrangeiros, dos homens de
negócios, do tropeiro em mulas a tocar, dos fazendeiros em busca da Corte
Imperial, dos Imperadores, dos nobilitados aristocratas de Dom Pedro II, dos
políticos da República Velha, dos literatos e do cidadão comum repleto de
afazeres no cotidiano das suas vidas.
E o Rio Paraíba na história sempre foi o guia para desbravar
e implantar núcleos populacionais no seu correr. Teve papel foi fundamental na
ocupação territorial do seu Vale e dele expandiu-se para as regiões da Serra da
Mantiqueira (Minas Gerais), Serra do Mar (Parati e Rio de Janeiro), barrancas
do Rio Piraí e Fazenda Santa Cruz (Caminho Novo) e em direção para aos portos
de embarque do café na região entre Mangaratiba e Angra dos Reis.
Todos que passaram pelo Vale do Paraíba deixaram registros
oficiais, memórias e outros escritos a seu respeito, constituindo-se em
verdadeiro manancial complexo de vidas entrecruzadas que teceram uma rede
social típica que a historiografia ainda não pôde abarcar por completo. Principalmente
em literaturas marginais e pouco conhecidas do público, enfeixadas em obras raríssimas
de apenas poucas edições, ou perdidas nos veículos da imprensa no final do
século XIX e começo do XX.
Com o advento da ferrovia, na segunda metade do século XIX,
ligando São Paulo ao Rio de Janeiro, e também com o aparecimento e incremento
da referida imprensa no mesmo período, a região passou a receber frequentes
visitas de cariocas e paulistas, notadamente de políticos em busca do voto ou
de literatos realizando palestras nas cidades cortadas pelo Paraíba ou em São
Paulo. Brito Broca rememora um desses, o escritor Coelho Neto, que visitou em
Guaratinguetá em 1921 para uma palestra que realizou no antigo Club Literário. E
os jornais do Rio anunciam a visita de Quintino Bocayuva e Rui Barbosa na mesma
Guaratinguetá.
E aqui destacamos, dentre os inúmeros e assíduos passageiros
da estrada de ferro que registraram o Vale do Paraíba em versos, em direção a
São Paulo, a figura do poeta Emílio de Menezes, cuja fama foi imensa em sua
época, como um dos últimos boêmios do Rio de Janeiro no alvorecer do século XX,
ao lado de Olavo Bilac, Paula Ney, Martins Fontes e muitos outros escritores de
maior renome na literatura brasileira.
Nasceu em Curitiba-PR em 04/07/1866 e faleceu no Rio de
Janeiro em 06/06/1818. Foi membro da Academia Brasileira de Letras, jornalista
e poeta com veia satírica da corrente parnasiana (1). E, em 1914, passando pela
região do Vale do Paraíba, escreveu um poema sobre o Rio Paraíba, publicado no
periódico paulistano “A Cigarra” e depois transcrito na biografia do poeta, de
autoria de Raimundo de Menezes (1). E
que também transcrevemos com o objetivo de resgatar e despertar para o leitor
as obras do poeta e da literatura no período dele como um todo. Notadamente
como fonte essencial para conhecer o pensamento dos homens letrados num período
de marcadas mudanças na vida do povo brasileiro (a transcrição vai como está na
ortografia original).
AO “PARAÍBA”
Quando te vejo o deslizar das águas
Claras, serenas como os bons momentos
De amor que correm plácidos e lentos,
Vão rolando contigo as minhas mágoas.
Mas, quando as vejo em torvelins violentos,
Tôrvas e turvas a raivar nas fráguas,
Extingo as chamas da alegria, apago-as:
Rolam contigo os meus contentamentos.
E que sobre mim mesmo não exerço
Fôrça contrária à tua, a mim ligada
Qual se liga a áurea rima a um verso terso.
E essa fôrça, que é tudo, vem de um nada:
Às tuas margens balouçou-me o berço
Da criatura eternamente amada!....
(1) PAES, José Paulo & MOISÉS, Massaud (organizadores).
Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira. São Paulo: Editora Cultrix, 1967.
(2) MENEZES, Raimundo de Menezes. Emílio de Menezes – o
último boêmio. 2 ed. refundida. São Paulo: Edição Saraiva, 1949. (Coleção
Saraiva, 13). p. 178. Imagem: O poeta Emílio de Menezes. In:
JORGE, Fernando. Vida e Poesia de Olavo Bilac. 5 ed. São Paulo: Novo Século Editora, 2007. p. 181.
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