Nunca soube, por nenhuma fonte
escrita ou oral, que o Conselheiro Rodrigues Alves tenha professado o
espiritismo. Pelo contrário, em vida, ao que se sabe, foi extremamente católico
e fiel aos ensinamentos cristãos, aplicando-os no cotidiano da política, no
executivo, no legislativo, e mesmo afastado dos cargos públicos eletivos. Exercia
o seu catolicismo principalmente na família, que cuidou com esmero ao longo de
grande parte da vida. Respeitando até a sua viuvez, para o resto de sua
existência terrena. As cartas da filha Catita que digam. Atualmente conservadas
no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Mas o que aconteceria, entre
tantos fatos possíveis, se o Conselheiro fosse um discípulo de Alan Kardec.
Penso que, não estando reencarnado, estaria observando a política brasileira e
paulista.
Horrorizado, principalmente, com
a displicência sobre sua memória terrena. Sem trégua estaria revirando na
tumba, pelo descaso com parte de seu significativo legado. Amargamente
enxergando o que o seu Estado e a sua Cidade, por seus políticos inertes e
obliquamente inteligentes, estão fazendo com aquela que foi a sua casa e hoje é
o imóvel fantasma que um dia foi o dinâmico Museu Conselheiro Rodrigues Alves.
Onde ainda está abrigado parte do seu cotidiano de vida. Memória e história em
abandono, entregue a toda sorte de elementos naturais destrutivos, sem chance
de reconstituir, pelo menos em sua grande parte.
Fechado por mais de cinco anos, o
que atualmente ainda resiste é apenas resquício do que foi o conjunto exposto
ao público desde a sua abertura. O acervo está sendo destruído pelo cupim,
alojado quase que exclusivamente numa sala, onde a umidade também impera e é
impiedosa.
O prédio, reformado (e não
restaurado), reiniciou o processo de degradação física, comprovando o dolo com
o dinheiro público dos políticos responsáveis, que continuam a brincar com a
coisa pública. Tratam-no como coisa privada, objeto de barganha política com
interesse notoriamente eleitoreiro, sem nenhuma finalidade cultural para a
comunidade.
Dizem que o erário municipal não
tem condições de mantê-lo, mas recordo que ele sempre funcionou com quase
nenhuma verba, fosse estadual ou municipal. Os últimos funcionários chegaram
mesmo a trabalhar um ano gratuitamente para o Estado, com o afinco de não
deixar morrer o ideal de preservar a memória e a história. Divulgando a cultura
local e regional. E funcionou desse modo durante muitos anos. Portanto, é
mexerico e inverdade, e mesmo desculpas esfarrapadas, dizer que não tem
condições de reabrir a instituição e mantê-la funcionando.
Querem sim, usá-la como
instrumento de troca, de favorecimento, com claro intuito demagogo como sempre
foi. Querem transformá-lo em secretaria municipal sem nenhum planejamento
anterior, para virar um local sem identidade própria. Preferem ganhar mais um
espaço público dito cultural, no caso um teatro para a cidade, em troca de
geri-lo. Cujas negociações se arrastam por parte do Estado e do município sem
nenhum resultado. Uma briga de figurões da vaidade que emperra o processo de
municipalização. Que ainda tem que passar pelo crivo da Câmara Municipal. Museu
e teatro jogados para a ruína, pelo delírio de pessoas pouco afeitas ao
raciocínio do bom senso.
O descaso chegou ao Ministério
Público, mas por “forças ocultas” até agora não se manifestou em termos
concretos. E muito menos puniu os verdadeiros responsáveis por tamanha barbárie
cultural. Parece que não conseguem chegar a um consenso sobre. As partes se
manifestam usando os argumentos mais pífios. Para safar da incúria e da odiosa
falta de compromisso. Cada hora é um argumento; a cada momento um instrumento
jurídico interposto para ganhar tempo, fugir da responsabilidade e nada fazer.
E se fizer, serão da maneira mais desastrosa, antiética, e nada profissional.
Similar a um trampolim ou poleiro para apadrinhados.
Até quando o Conselheiro Rodrigues
Alves, de sua tumba, vai gritar por socorro. E ver que aquilo que tanto prezou
em vida está se perdendo. Perde-se o patrimônio do povo e perde-se a lisura, a
honestidade e a boa vontade por parte dos homens públicos. Certamente está
consciente de que não existe mais governo sério, que não cuida do público, e
que apenas priorizada a vida privada.
Podem ter certeza, caros
leitores, ainda existe solução para o Museu Conselheiro Rodrigues Alves. E mais
ainda, pessoas disposta a dar o suor para colocá-lo novamente ao alcance da
comunidade. Ideias existem, mas ninguém consulta os verdadeiros profissionais
que sabem e bem fazem um bem maior pela cultura.
Não vamos acreditar em
dificuldades financeiras, nem em outras desculpas, muito menos em boas
intenções. Disto, o inferno está cheio.
Imagem: BIBLIOTECA NACIONAL. Gazeta de Notícias - 14/08/1904.
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