terça-feira, 8 de dezembro de 2015

A Emancipação de Aparecida e a Imprensa Local

A imprensa escrita teve papel destacado no processo de emancipação da cidade de Aparecida na década de 1920, como instrumento para esclarecer a opinião pública acerca da necessidade de autonomia frente aos problemas e desafios trazidos pelo contínuo descaso político da edilidade guaratinguetaense. Como, também, para derrubar teses inverossímeis apregoadas pelo partido político situacional sobre a inviabilidade jurídica do desmembramento do território. E para dar maior ênfase e encorajar a população na luta pela causa, presente desde o final do século XIX.
Justamente no período de crises e mudanças políticas por todo o país, com certo comprometimento de determinadas classes sociais que lutavam por seus direitos de liberdade e atuação nos destinos das cidades. Antecipando a derrocada quase completa das oligarquias regionais paulistas representadas por famílias, cujo domínio político baseava-se na tutela do indivíduo, instituída na forma do jogo de favores, no voto de cabresto e no acesso aos empregos públicos por militantes e correligionários leais. A época dos coronéis e da indistinção do público e privado na gerência dos negócios do executivo e do legislativo. Como da política de alianças realizadas em nível partidário e eleitoral para a escolha dos candidatos. Período do voto aberto, das fraudes e dos eleitores escolhidos de forma censitária.
Em Guaratinguetá, por esse tempo e dentro desse quadro, a atuação da imprensa não era indiferente a tal situação e estava calcada principalmente no jogo político. Existiam diversos jornais e informativos, e dentre eles “O Correio Popular”, sob a direção do Partido Republicano Paulista (PRP) e os jornais “O Pharol” e “A Liberdade”, de cunho oposicionista. O primeiro sob o julgo da família Rodrigues Alves, conhecido como partido alvista; e os dois últimos sob a orientação da família Camargo (partido camarguista). Os alvistas eram contrários e os camarguistas a favor da emancipação de Aparecida.
E foi através deles que foram travados os principais argumentos e contra-argumentos sobre a emancipação do município de Aparecida, cujo ápice dá-se entre os anos de 1924 e 1928, finalizados com a vitória em 17 de dezembro de 1928. Principalmente nos editoriais de ambos os jornais. “A Liberdade”, criado para o fim exclusivo de lutar pelo status de município e combater a campanha contrária do PRP. E o “Correio Popular”, em circulação anos antes, para servir de veículo de catecismo crítico a impedir o movimento de fragmentação do território guaratinguetaense. Sem excluir, que independente, existiram discussões, brigas e desentendimentos no seio da população. Entre pessoas comuns, residentes em Guaratinguetá e Aparecida, conhecidos pejorativamente como trancas e gamelas.
“A Liberdade”, circulante em primeiro número a 16 de março de 1924, sob a direção de Júlio Machado Braga (diretor) e Irineu de Carvalho (gerente), procurou, ao longo do tempo, rebater as justificativas emitidas pelo “Correio Popular”, que defendia ser impróprio e impossível pensar em desmembramento do território, pois o bairro ou freguesia de Aparecida não possuía qualificativos jurídicos para almejar tal liberdade. Não possuía número suficiente de habitantes (10.000) e que sua ligação com Guaratinguetá era feita apenas por uma avenida, por distância abaixo dos seis quilômetros previstos em lei; e que assim independente ficaria com território minúsculo, e sem casa apropriada para abrigar a Câmara Municipal.  
Para o olhar dos signatários do “A Liberdade” as teses do rival eram inadmissíveis por não corresponder com a realidade. Defendiam, em suas páginas, diante de uma nova e promissora conjuntura política, e embasada na ideia de direito e liberdade iluminista, a possibilidade e a necessidade de ser uma cidade com recursos próprios aplicáveis em benefício do seu crescimento, enquanto uma localidade de fundamental importância no cenário nacional e internacional, por ser Santuário de Nossa Senhora Aparecida e sede de uma basílica menor. Contando com apoios políticos importantes, como o de Washington Luís, recém-eleito e empossado para o governo do Estado; da maior parte da Câmara dos Deputados Estaduais e de uma renovada liderança jovem, sob a batuta do Doutor João Batista Rangel de Camargo, ocupante de uma cadeira na mesma casa de leis. Sobretudo da população, ativa participante das subscrições levadas a efeito, requerendo urgência para a questão em causa.
Os oposicionistas revidavam nas páginas e nos editoriais do “Correio Popular”, com circunlóquio verbal extremamente pobre e apelativo, acusando de traição todos os favoráveis ao processo. Mas diante dos fatos reais, nada puderam fazer, pois era evidente a situação de descaso de Guaratinguetá. Falta intensiva de água, aparência urbana decadente nos logradouros e praças no entorno da Basílica, e notadamente os altos impostos municipais cobrados da população, a cada ano crescente, sem retorno em benefícios de infraestrutura. 
Venceu a “Causa Santa”, como designou o articulista do jornal “A Liberdade”, que quebrou uma situação que perdurava desde fins do século XVIII. Pois as melhores terras e a maior parte da renda de Guaratinguetá estavam e vinham do seu antigo bairro.
E, mesmo assim, o oposicionista jornal “Correio Popular”, doravante, na década de 1930, transposto para “Correio Paulista”, continuou a existir servindo uma elite social e política da cidade, muita embora com outras características.
Sem perda de tempo, esses mesmos opositores, vendo a causa própria perdida, usaram o recurso de adesistas de última hora, defendendo a causa no último momento, ao dar entrada ilicitamente no pedido de emancipação na Assembleia Legislativa de São Paulo, através do oficialismo do Partido Republicano Paulista.

Referências
Hemeroteca do Museu Frei Galvão - Arquivo Memória de Guaratinguetá.

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